Monarquia das Palavras
Quando é outra era, somos obrigados a ser.
segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024
gole
terça-feira, 2 de janeiro de 2024
mentira
Passei por algumas situações recentemente que não pareciam verdade, seja pelo teor de aleatoriedade quanto de absurdo. Olhei as mãos, conferi se era real - custava acreditar. Como cheguei àqueles cenários? O que regia meus pés?
Então me levantei e sentei novamente e repeti como se fosse um jogo, como se alguma criança gritasse ao lado. Tudo que há é o murmúrio e comentários dos adultos, fascinados por músicas clichês ou o sofrimento alheio. Há algo fetichista na curiosidade dos detalhes, nos comentários perversos de quem não entende e quem condena - mesmo quando não há mais depois. São pontos finais, e aqui volto para mim.
Poucas horas antes eu estava reclamando de mais um ano novo, das escolhas erradas e de novamente me enfiar, como roupa amarrotada em uma mala, em situações nas quais não deveria estar, com pessoas aleatórias e todo o potencial de destruição necessário. Neste ano abandonei a taça e puxei a chave do carro quando não havia mais jantar ou sobremesa que justificasse minha permanência, assim o alcool não me derrubou pelas costas - ou de frente - para uma tragédia novamente. E assim lembrei dos anos anteriores.
E assim fatiguei um ano quase que amaldiçoado por novos termos e as últimas das palavras.
E assim foi: eu disse que este ano só perdia para aquele, e nesse roteiro do primeiro dia do meu ano assim foi que dei o gancho para o que estava por vir. Que 2024 tenha piedade de todos nós, porque aparentemente serão muitos assuntos a serem enfrentados - e finalizados, espero.
E o quanto de nós é necessário para encerrar e perdoar?
Meu deus, talvez agora esteja começando a cair a ficha, ao som de musicais e tons desbotados nas ruas. Ou talvez só aconteça quando eu o ver e assim materializado e deitado com as flores que os segredos e detalhes agora só vivem comigo - eu rezo para que a luz possa levar o que deve das memórias e iluminar o caminho.
Eu não sei muito no que acredito, sei mais no que não acredito. Sei da verdade, do que aconteceu, do que quero esquecer e das cicatrizes. Do que não sei sobre o depois, um dos poucos fios que me fazem sentido e creio é que não devemos prender as pessoas, seja antes ou depois. E assim escolho perdoar e deixar ir, escolho pensar nos vários traços bons e sentir a única coisa possível hoje: essa mistura de tristeza e sonho ruim, longe da realidade.
Fazia um tempo que eu planejava voltar ao texto corrido, não me prender aos versos e fuga das rimas, e hoje consegui. Hoje consegui por obrigação do peito rasgar as linhas e lembrar que a gente é adulto, mesmo que não pareça. Que mais do que pegar o carro, pagar contas e pensar no futuro, ser adulto é muito isso, a finitude da infância e de tudo, da inocência à esperança.
Espero que algum dia o vento sopre mais leve como um abraço para quem ficou e, de alguma forma, haja paz.
sexta-feira, 20 de outubro de 2023
Ainda sou poeta?
Houve um dia em que a matéria prima de terceiro grau
em uma ou três aulas de química
era o burburinho de fundo da minha escrita, e,
como quem dorme com a tv ligada, eu desligava o mundo
e o reescrevia com tinta azul
Hoje, mesmo sob o maior dos silêncios e maior das luas, eu tremo a caneta, eu temo o teclado
e o que me era diário virou lembrança - mas esta metalinguagem se prova contrária
Há dias, momentos e visões que me tiram dessa inércia e posso esquecer
como se escreve e fazer novamente, posso esquecer
do-mundo-aquecendo-da-panela-no-fogo-das-ruas-escuras-que-nos-observam-do-plano-dos-homens-vis
tudo some e retorna em versos
é espaço de amor ou rimas
- e hoje já não gosto de rimar
Digo que essa corda não cabe em meu pescoço.
As margaridas não mais desbotam desde as datas reafirmadas como votos de um futuro igual:
amor não é matemática
poesia não cabe no seu calendário
(feliz aniversário-não-mais)
Quem sabe isso seja suficiente
A quem interessa ouvir os devaneios do verso do caderno, eu retomo
ligo e desligo o rádio, a tv, a notícia que já nos matou e em alguma estação consiga
relembrar quem fomos e reescrever quem somos
mesmo que beire a livro de autoajuda, remédio controlado
descontrole remediado
e consonância involuntária
B²
segunda-feira, 21 de agosto de 2023
Caminhos e o que mais puder cruzar
quinta-feira, 1 de junho de 2023
Setença e dia de hoje: jamais
Hoje o dia mal começou e meio sem querer eu revisitei alguns traumas
Alguns, para ser modesta e quem sabe não dizer todos ou ao menos uma parte da raíz.
Quem me conhece, sabe
Sabe que eu exagero nos braços e sinto demais, mas quem conhece a finco sabe que não minto
e nem planejo rima
Quem me conhece, sabe bem
meu bem
que eu sou boa com datas, com as falas
principalmente as que ferem e falham - minhas ou não
e de datas, hoje, por acaso eu me lembrei
mesmo que às vezes o nome surja à tona com amigos antigos
ou pesadelos recorrentes.
Eu acordo toda vez de cada pesadelo perfeitamente igual com a mesma sentença
e quem sabe um dia meu corpo esteja velho demais para se encaixar na perspectiva de uma colegial
e o espelho de Narciso-Dorian afunde no rio
e eu esqueça o que já fui.
Mais do que fui, mas o que me fizeram
lápis escrevendo lápis em uma lousa verde, olhos negros.
Talvez eu jamais seja capaz de alguns perdões, e em primeiro este.
O dia segue, eu reamonto minhas palavras de década
O dia segue, eu não o sigo mais.
Jamais.
B²
sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023
Raio
Se eu virar os olhos, se eu virar estrela
se eu ficar na ponta dos pés
não me puxe de volta ao fundo do mar
[ já sou fogo e febre
glitter e taquicardia]
Se eu perder a hora, não me acorda
deixa que a luz não entre
que eu quero voltar
Se eu disser que não, é porque nunca foi dito.
é mentira pois o céu planou no meu suspiro
horas depois de um pedido
[ pode ]
...
Se eu perder a carona, deixa que eu dou um jeito
O caminho eu já sei de cabeça, mas o final é diferente
[finalmente!]
Se eu me confundir é porque não preciso justificar texto livre
só as minhas palavras sabem a ordem
de um tempo que se resignificou
B²
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023
Fadas mortas
Asas ao chão de um canto cinza, mudado.
Cinza? Verde musgo? Não sei ao certo, não lembro, não enxergo
Complexos escritos em caligrafia feia, fincada no lado do corpo.
Um, dois, três
Memória específica de um traço em que não me encaixo jamais:
Da ponta dos pés ao pulso não chegam ao início da serra.
Minha bacia segura as roupas molhadas
o canto das águas, o molde antigo vindo do barranco
em espiral eu caio ao chão.
Em algum futuro acho (acha?) uma carta esquecida, apagada
sem nunca lembrar o que foi escrito -
mas meu corpo permanece imóvel.
O que será do tempo? Vai apagar mais nomes, queimar rosas e rasgar os papéis?
O que há de ser? Dos corredores dos supermercados, dos segredos e das mentiras?
Tudo há de no fim virar poesia?
Ou a gente nunca teve chance de fugir dessa torre?
Uma carta virada e teimosa em retornar
Adiante, sozinha, não adianta.
[
Nojo de todos os transtornos que esse predador finca na mordida.
]
Uns trocados no fundo do bolso da calça jeans, fiapos e fios de cabelo perdidos.
Despedidas de um tempo que, ainda hoje, é retorno freado
é fuga, hipotenusa
é um ser preterido
[
é tudo
do que a mim
]